“Enquanto estiver alguém escrevendo, vai ter alguém para ler”

Há quem cante o mundo com notas. Há quem o escreva em versos. PC Desidério faz os dois.
É da palavra que ele extrai sentido — seja na forma de melodia, seja no sopro contido de um poema noturno.
Paulo César Desidério Costa, ou simplesmente PC Desidério, caminha por entre linguagens com os pés firmes na sensibilidade. Formado em Letras, com passagens pelo jornalismo, vive hoje a arte como músico e produtor cultural. Mas mesmo fora das partituras e das manchetes, ele continua sendo o que nunca deixou de ser: alguém que escreve porque precisa. Porque sente. Porque acredita.
Nas palavras que nascem da bicicleta solitária, do silêncio íntimo, do amor platônico adolescente ou da crítica social precoce, PC Desidério traça um mapa de si e do tempo em que vive. Seu livro “Cada um com seus poemas”, lançado ainda na juventude, foi um desses gritos que saem calados — porque, como ele mesmo define, “escrever é a única forma de soltar um grito mantendo o silêncio”.
Hoje, com novas ideias fervilhando e o desejo de explorar a prosa, ele segue. Mais contido, talvez. Mais cuidadoso. Mas jamais parado. Porque enquanto houver alguém escrevendo, haverá alguém para ler. E se a literatura brasileira precisa de fôlego, é de autores assim que ela respira.
E para que você o conheça mais de perto, deixamos aqui um breve trecho de poema recente, Alívio, que traduz com delicadeza o espírito de sua escrita — aquela que acolhe, confronta e afaga.

Alívio
por PC Desidério
Liberdade é receber
E dar espaço
Para sentir e ser sentido
Em todos os sentidos.
Não fingir nada
Ver verdade na suficiência
Completude na confiança
Permitir a si mesmo
Experimentar o alívio
De jamais precisar
Deixar de ser você.
A seguir, leia a entrevista na íntegra com o autor. Uma conversa sincera, reflexiva e pulsante — como a poesia que ele carrega nas veias.
Entrevista – PC Desidério

FS: Quem é você quando não está escrevendo?
PC Desidério: Sou Paulo César Desidério Costa, conhecido como PC Desidério. Formado em Letras, tenho DRT de jornalista, profissão a qual exerci por alguns anos. Atualmente sou músico e produtor cultural.
FS: Quando e como a escrita entrou na sua vida?
PC Desidério: Comecei a escrever ainda no Ensino Fundamental. Uma vez fiz um poema criticando a conjuntura política do país, com a visão de mundo que eu tinha naquela época. Meados de 2006, 2007 talvez. Foi a forma que escolhi para responder a uma atividade e a professora achou que eu estava copiando o poema. Foi o maior rolo na época, daqueles em que a mãe vai na escola e tudo mais.
Mas a coisa se acentuou mesmo poucos anos depois. Tive uma paixão platônica no Ensino Médio, quando eu era adolescente e aí a coisa desandou de vez. Comecei a escrever com frequência mesmo a partir desse episódio e, por algum motivo, ia guardando.
FS: Você já publicou alguma obra? Onde os leitores podem encontrá-la?
PC Desidério: Sim. Em 2014 publiquei o livro “Cada um com seus poemas”, cujo gênero é autoexplicativo (risos). Tenho alguns exemplares escondidos comigo, pouca coisa mesmo. Felizmente, vendeu muito bem à época. Nunca cheguei a lançar a edição virtual da obra. Meio que deixei de lado, mas posso fazer isso.

FS: Qual das suas obras tem um lugar especial no seu coração — e por quê?
PC Desidério: Bem, como só lancei um livro, vou ser um pouco enigmático na resposta. Minha obra preferida é aquela que ainda não lancei. Aquela que sequer escrevi. Acho que isso é uma espécie de combustível para que a gente nunca pare de escrever, mesmo que não venhamos a ter a felicidade de publicar depois.
FS: Como nasce uma história para você? De uma ideia, imagem, frase…?
PC Desidério: A nascente da escrita é o pensamento, a reflexão. Eu adorava pensar em versos quando eu andava bastante de bicicleta, por exemplo. Ali era eu comigo mesmo o tempo inteiro, numa atividade mais tranquila, em que era permitido entrar em contato com o mundo da lua por mais tempo, sem essa loucura que o trânsito motorizado oferece.
Então, as coisas que eu vivia e que via os outros viverem ficavam ali, pairando na minha cabeça e eu imaginava meios de materializá-las, de botar tudo no papel.
Como hoje a rotina mudou um pouco, reduzi drasticamente a produção de poemas, se comparado ao que chamo de “auge criativo”. Antes eu escrevia uns três por dia. Hoje eu tenho períodos em que fico sem escrever absolutamente nada, no máximo pensamentos soltos que servem como desabafo nas minhas redes sociais.
Mas a matéria prima da escrita para mim sempre será a vivência. Se não a minha, a dos outros.
FS: Tem alguma rotina ou ritual de escrita?
PC Desidério: Escrever já foi uma rotina diária para mim. Eu me preocupava muito em produzir o máximo de coisas possíveis, encarava como algo sério demais. Só que fui percebendo que não precisa disso, que não há porque competir comigo mesmo e produzir tanto em algo que eu jamais vou enxergar como trabalho.
Escrever é lazer, mesmo que seja sobre as coisas mais duras da vida. Hoje eu meio que me desprendi disso, até para não pirar.
Pensava muito em acumular coisas, escrever mais quantitativamente. Atualmente a minha meta é escrever bem, ficar bem com o que eu escrevo e, se possível, despertar em alguém um gosto pelo que eu fiz, para que queiram ler mais do que eu tenho a dizer.
Em linhas gerais, o ritual envolve silêncio e concentração. Não tem muita hora nem lugar. Porém, quando “o santo baixa”, a gente precisa descarregar, seja na tela ou no papel, com a tranquilidade necessária para entender a mensagem que nasce dentro do ser e desenvolvê-la para passar a diante.
FS: Quais autores ou autoras te formaram como leitor e escritor?
PC Desidério: Por eu ser músico, sempre considerei letras de músicas, sobretudo as com conteúdo, poemas. Então, minhas influências para ser poeta vieram de lá, através de Gabriel o Pensador, Humberto Gessinger e Chorão. Esses são os três que me marcaram muito pelo que diziam nas canções.
Partindo para o campo literário propriamente dito, aí eu preciso dar o braço a torcer para Gabriel García Márquez na prosa e na poesia, admiro muito o trabalho de Paulo Leminski e Carlos Drummond de Andrade.
FS: E hoje, quem você costuma ler? Algum livro recente que te marcou?
PC Desidério: Tenho lido muita literatura brasileira, especialmente a contemporânea. Depois que li “Tudo é Rio” da Carla Madeira, me tornei um dos maiores fãs e defensores desta mulher na face da Terra.
É o tipo de literatura que não dá vontade de parar. Tanto que comprei os outros livros dela e “zerei” a sua obra com “A natureza da mordida” e “Véspera”.
Tenho para mim que para competir com as telas hoje em dia, precisa ser uma história que prenda a pessoa tanto quanto deslizar a tela. Qualquer coisa da Carla Madeira é assim. Faço panfletagem grátis da obra dela.
FS: Em uma frase: o que a escrita representa para você?
PC Desidério: Escrever é a única forma de soltar um grito mantendo o silêncio.
FS: O que podemos esperar de você nos próximos capítulos?
PC Desidério: Desejo publicar mais. O mercado livreiro é extremamente terrível, sobretudo no Brasil, país em que se lê cada vez menos. Só que não podemos deixar a peteca cair.
Enquanto estiver alguém escrevendo, vai ter alguém para ler.
Precisamos acreditar que nossas mensagens podem ajudar uma pessoa, entretê-la, alimentar a sua alma.
Tenho material para lançar mais de um livro, mas tem muita coisa pueril, assim como no livro que lancei, lá aos meus 18 anos. Por isso, seria importante passar um pente fino, mas sem retoques.
Entretanto, atualmente, o meu maior desejo é produzir e publicar algo em prosa. Tenho ideias dentro da cabeça que me deixam muito entusiasmado, falta é tempo para colocar tudo no papel, concatenar as coisas e entregar um produto final tão bom quanto o bruto parece.
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